5.
Além de todos os limites
Quando a Land Rover parou em frente à nossa casa, todos saímos dela. O clima estava meio triste, um clima de despedida.
— Não acredito que estão mesmo indo indo embora. - choramingou minha prima.
— Pois é... também estou triste. - disse Lídia.
— Pode crer, eu também. - concordou Léo.
— Mas vocês também podem ir pra lá, não é meninas? - sugeriu Neit me olhando de forma significativa. De certo, ele não havia esquecido nossa conversa de outro dia.
— É claro que vamos! Adoro aquela cidade. Aiii vou morrer de saudades de vocês... - minha prima planejou.
— Não morra! Preciso de você viva... - brincou Lídia enquanto abraçava Mariana e eu fui arrebatada por um abraço de urso pelo Léo.
— Foi muito tri1 conhecer você, Nia. Vê se aparece lá em Bonja, hein?
— Digo o mesmo, Léo. Eu apareço sim, mas se continuar me chamando por esse apelido idiota, eu nunca mais falo com você! - brinquei enquanto ele me balançava no ar, como sempre.
— Báh... mas já acostumei em te chamar assim.
— Então desaprenda! - pedi enquanto me despedia de Lídia com um abraço. Depois de me despedir dos irmãos mais novos, fui até Neit.
— Vou sentir falta de vocês. - confessei meio emocionada, segurando o ursinho que ele me dera.
— É... eu também. - ele disse me envolvendo num abraço apertado, que simplesmente não pude deixar de corresponder. - Nia, qualquer coisa que precisar, qualquer coisa mesmo, você pode me procurar. - ele sussurrou, e eu engoli em seco.
— Neit, eu... - oscilei.
— O quê? - incentivou ele, ainda sem me soltar.
— Nada... - me afastei para olhar em seus olhos de esmeraldas – absolutamente nada.
“ Absolutamente nada que você possa fazer ou saber. ”
Pensei, sentindo-me oprimida pelo peso em ser uma guardiã do maldito segredo da existência dos vampiros. Pela pressão dos sonhos estranhos e os encontros com o sobrenatural, pelo meu trabalho, por Savanah e agora, por ter que me separar dos meus amigos. O que mais faltava?
— Tá parecendo evasiva. - Neitan denunciou.
— Talvez... - dei de ombros e ele estreitou os olhos.
— Sabe onde me encontrar. - reforçou o convite que parecia ter muito mais envolvido do que uma simples visita social.
— Ninguém pode me ajudar, Neit... - falei sem pensar, e me arrependi logo em seguida.
— Por que não? - ele sondou e nossa conversa foi interrompida quando os outros se aproximaram.
— Vocês vão pegar a estrada de noite? - Indagou Mariana, e Neitan respondeu sem irar os olhos de mim.
— Vamos embora amanhã cedo.
— Ah bom... é mais seguro mesmo. Não que você dirija mal, né? - brincou ela .
— Claro. - disse Neitan finalmente desviando os olhos.
— Então, esperamos vocês por lá, hein meninas? - disse Lídia entrando no carro antes de Léo.
— É, vão mesmo. - disse ele fechando a porta.
— Nós vamos sim. - afirmou Mariana.
— Até lá então. - despediu-se Neit antes de dar a volta no carro.
— Até. - Mariana e eu dissemos em uníssono antes do carro se afastar. Ficamos no portão até o perdermos de vista.
— Ah... odeio despedidas. - reclamou ela quando entramos em casa.
— Eu também, mas lá é a casa deles né?
— Pois é... as três melhores amizades que tive na vida tinham que morar em outra cidade?! É muito azar... bem, vou dormir. Tenho aula amanhã, ninguém merece.
Ela disse fazendo uma careta e eu ri enquanto girava a maçaneta da porta do meu quarto.
— Boa noite. - falei, maneando a cabeça.
— Boa. - disse ela antes de entrar no quarto.
Assim que entrei, fechei a porta atrás de mim e caminhei pelo quarto em direção à cama. A lua estava cheia lá fora, mas sua luz prateada entrava pelas portas abertas iluminado e formando sombras pelo lugar. Eu olhava o ursinho que havia ganho de Neit e decidi chamá-lo pelo nome do parque. Tupã. Não consegui evitar um sorriso ao lembrar da noite incrível que tinha passado.
— Adivinha quem é? - sua voz sussurrou no meu ouvido um segundo depois de eu ter minha cintura enlaçada por seus braços.
— Hum... deixe-me ver... - brinquei – Conde Drácula? - ouvi seu riso baixo e ganhei um beijo no pescoço.
— Quase. Parece que está chegando agora, onde estava? - Damian inqueriu e eu joguei o Tupã na cama e girei em seus braços.
— No parque... foi tipo uma despedida. - contei meio tristonha.
— Despedida?
— É... meus amigos vão voltar pra Bom Jesus amanhã. - expliquei pegando em seu rosto uma sutil expressão de satisfação.
— Mesmo? Hum, não posso dizer que lamento. - confessou e eu fechei a cara.
— Ah sei... essa sua birra com o Neitan. - revirei os olhos e me afastei dele. Só então notei que ele usava uma roupa diferente. Um terno todo preto, mas sem gravata, com alguns botões da camisa abertos – alguma ocasião formal?
— Uma viagem internacional pede alguma formalidades. - respondeu ele me pegando de surpresa.
— Viagem internacional? Como assim? - me apavorei um pouco.
— Lavígnia, eu vou me ausentar do país por algum tempo. - contou de forma calma e indiferente.
— O quê? Pra onde? - indaguei sentando na cama sem conseguir acreditar naquilo.
1Gíria gaúcha, significa muito legal.
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