>

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Capítulo 8 / 1ª parte

8. Encontrar respostas, traz à tona
perguntas 


Lá estava eu novamente, num sonho. O mesmo lugar, as mesmas pessoas, mas ainda sem sons e muito menos respostas. A mesma cena, o mesmo sonho. Pessoas enterrando a caixa prateada. E como das outras vezes, meu sono tinha sido roubado e acabei sentando na cama e olhando para a penumbra do meu quarto. Depois de alguns minutos, levantei e fui até a janela. A lua estava cheia, e plena banhava a noite escura com seu brilho pálido prateado. Algo em mim me empurrava para a floresta, para aquele lugar. Mas em contra partida, talvez meu senso de realidade, me dizia para não agir como uma maluca e deixar isso pra lá.


Com um suspiro profundo, fechei a cortina e voltei para a cama. Eu sabia que tudo que eu não precisava naquele momento era agir como uma covarde. Assim que deitei, cobri a cabeça com o travesseiro, talvez tentando fugir de algo que na na verdade, estava dentro de mim. Onde estava minha coragem agora? Onde estava minha convicção de encontrar a tal resposta? Onde tinha ido parar minha promessa de não parar, de não descansar enquanto não encontrasse a explicação para tudo aquilo? Talvez ela tivesse se escondido atrás do medo de encontrar algo desconhecido. De topar com algo de proporções que eu não imaginava. A resposta que eu tanto queria, no fundo me dava medo.

Então, por aquela noite, resolvi não fazer nada. Embora eu soubesse o que deveria fazer. Virei para o lado e me concentrei em expulsar qualquer pensamento da minha cabeça e dormir. Sem nenhuma surpresa, acordei na manhã seguinte com a lembrança de ter tido de novo e várias vezes, o mesmo sonho. Quem seriam aquelas pessoas? O que tinha na caixa que enterraram? Com uma olhada rápida para o relógio na parede, descobri que mal se passavam alguns minutos das seis horas da manhã. Sabendo que não conseguiria mais dormir de jeito algum, pulei da cama indo ver o cenário daquele sonho; a floresta.

Abri a cortina e tive uma surpresa. Névoa. Sim, uma densa e branca bruma que até tocava o chão, envolvia os troncos das árvores e estava bem deslocada estando ali numa manhã de verão. O outono só começaria no próximo mês, então as manhãs nebulosas ainda estavam longe. Estreitei os olhos, e olhei a rua deserta. Tudo que se podia ouvir naquela manhã de domingo era a orquestra formada pelo canto de diversos pássaros. A fauna em Bom Jesus era bem diversificada, principalmente no tocante às aves. Eram muitos e de diversas espécies, que cantando juntos naquela manhã, formavam um cenário bonito e misterioso.

Minutos depois de apenas ficar olhando, resolvi ir lá fora. Sem um porquê específico, ou com um que eu não queria admitir. Apenas coloquei meus chinelos e saí do quarto, desci as escadas com muito cuidado para não fazer barulho, e com o mesmo cuidado abri a porta da cozinha. Assim que saí, fui atingida por uma manhã fresca e muito agradável. O céu estava azul, mas o sol ainda não havia nascido. Fui até o portão e segurei nele, sentindo a madeira fria e coberta pelas pequeninas gotas de orvalho. Mirei a floresta e assim fiquei por vários minutos. Questionando-me em várias coisas, acabei perdida em meus pensamentos.

Então, algo incrível ocorreu. Como que uma antiga lembrança surgindo na realidade, uma grande borboleta azul e preta surgiu flutuando pela neblina transparente e esbranquiçada. Meus olhos seguiram seu voar delicado e belo. E assim como há dezenove anos atrás, abri o portão e atravessei a rua atrás dela. Entrei na floresta e a vi voando em círculos pelo espaço entre as árvores para cada vez mais alto. Ao seguir sua suave trajetória para o alto, vi os primeiros raios dourados do sol que nascia, esgueirando-se pelas folhas e galhos das árvores e projetando-se pela neblina.

Era tão lindo. Como algo que ocorria para me tirar um pouco da realidade estranha e cada vez mais obscura que eu vivia. Contemplei o voo da borboleta até ela sumir pela floresta, então fechei os olhos e prestei atenção ao canto dos pássaros. Tudo estava lindo e perfeito, mas então uma suave brisa começou a soprar. As folhas caídas no chão começaram a voar ao ponto que a brisa transformava-se num vento forte. Abrindo os olhos, descobri que as folhas giravam em minha volta como se eu estivesse no olho de um tornado. Me assustei com a mudança brusca do tempo e olhando ao meu redor, constatei que aquilo não era simplesmente uma obra da natureza. Era de novo, meu sobrenatural.

O vento ainda soprava forte mantendo o redemoinho de folhas ao meu redor, quando - como que vindas de algum projetor – imagens formaram-se à minha frente, na parede inconstante de folhas. Eram pessoas em batalhas que, pelas suas roupas, pareciam muito antigas. Espadas e sangue se misturavam nas imagens sobrenaturais e desconexas, como num filme do começo do século passado. Vi estacas e finalmente... vampiros. Deixei de lado o medo – deixaria para me assustar depois – e estendi a mão para as imagens. Mas assim que fiz isso, as folhas caíram no chão e o vento cessou imediatamente.

Engoli em seco e finalmente comecei a compreender que, o que quer que fosse que eu tivesse que descobrir, tinha a ver com os misteriosos Caçadores. Os Von Otman. Mas por quê? Eu me perguntei. Talvez fosse pela antiga e complexa ligação de minha família com eles. Mas por que eu? Será que era porque eu tinha visto o Caçador? Aquilo tudo na verdade seria o sobrenatural deles e não meu, como eu pensava? Será que os Caçadores queriam entrar em contato comigo? Mas por que comigo? Eles poderiam muito bem assombrar George e todo o resto do maldito Conselho. Espere... assombrar? Que proporções teriam os poderes deles?

Só então me dei conta de que poderia estar sendo observada. Me virei para todos os lados procurando qualquer coisa entre as árvores. Mas se estivesse mesmo sendo observada por um deles eu não corria perigo... ou corria? Então senti um calafrio percorrer meu corpo, talvez fosse por estar com meu shortinho xadrez de dormir e uma regata branca às seis e alguma coisa da manhã dentro da floresta.


“ Tudo bem... chega de mistérios sobrenaturais por hoje. ”


Pensei antes de correr de volta para a rua. Assim que a alcancei, percebi que toda neblina havia sumido e o sol brilhava. Tudo perfeitamente normal.

— Onde você estava? - Mariana perguntou assim que entrei na cozinha.

— Ah... saí pra dar uma volta e aproveitar a manhã. - falei a primeira coisa que me veio à cabeça e ela ergueu uma sobrancelha.

— De pijama?

— Hum... não tem ninguém na rua à essa hora então não tem problema. Mas e você, o que faz acordada tão cedo? - perguntei indo pegar uma xícara.

— Não consegui mais dormir.

— Estranho, você sempre dorme até tarde. - observei, enquanto colocava café com leite na xícara.

— Pois é... bem é que... sei lá. - Mariana hesitou e eu tive a impressão de que ela queria me contar alguma coisa, mas que por alguma razão tinha desistido.

— Hã?

— Esquece... temos que sair mais cedo hoje. Vamos ajudar na arrumação da praça para o evento de hoje. - anunciou ela toda eufórica.

— Como assim vamos? Não me lembro de ter me envolvido nisso. - retruquei levantando uma sobrancelha.

— Não se preocupe, eu sei disso. Por isso eu mesma envolvi você e a Ághs.

— Eu o quê? - Ágatha perguntou entrando na cozinha, e eu maneei a cabeça.

— Você vai ajudar junto com Lavígnia e eu na arrumação da tarde de cinema.

— Mesmo? Nem me lembro de ter concordado com isso mas... que legal! - minha irmã aceitou a ideia numa boa enquanto eu ainda relutava.

— É por isso que eu gosto de cidade pequena – recomeçou Mariana – a gente se envolve mais com as coisas e consequentemente com as pessoas. Adoro estar envolvida nessas em tudo.

— E envolver os outros também. - observei irônica, mas fui ignorada pelas duas.

— E eu não sei?

— Claro que sabe, você deveria ter visto a minha festa no mês passado. Foi algo fantástico.

Exibiu-se Mariana. Mas eu não estava mais ali. Minha mente tinha outra vez se voltado para as coisas que andavam acontecendo comigo. E minha certeza de que era algo dos caçadores, se fortalecia cada vez mais. Eu sentia que tudo aquilo era apenas uma tentativa de contato deles comigo. O porquê daquilo, era o que eu tinha que descobrir. Mas o que deviam querer comigo? Quando dei por mim, o assunto que envolvia as duas comigo à mesa tinha acabado, e as duas estavam assim como eu, totalmente dispersas em algo. O fato me pareceu bem interessante e prestei atenção na cena. Sim, elas estavam pensando muito em algo.

— Bem... e a que horas nós vamos para a praça? - perguntei, tirando as duas do transe.

— Hã? Ah... lá pelas dez horas mais ou menos. O evento vai começar à uma da tarde então temos que ter tudo arrumado até lá. - respondeu minha prima.

— O quê? Mas e como vamos almoçar? - protestou minha irmã.

— Vou levar uns sanduíches. - replicou Mariana ao se levantar e Ágatha trocou um olhar resignado comigo.

Como planejado, às dez horas saímos de casa no meu carro. Minha avó tinha ido mais cedo, como parte da associação de moradores da cidade ela tinha um pouco mais de coisas para se preocupar do que nós. Meu avô – como sempre – havia ido torturar peixinhos inocentes em algum rio ou lago da cidade junto com os amigos. Quando estacionei na frente da praça, ela já estava com algum movimento, mas apenas do pessoal que organizaria a coisa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário